Brasil tem recorde de amputações de pés e pernas em decorrência do diabetes
No Rio Grande do Norte, foram mais de 170 procedimentos hospitalares pelo SUS em 2023
A Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (SBACV) realizou um levantamento que analisa o cenário de cirurgias e amputações de membros inferiores (pernas e pés) pelo Sistema Único de Saúde (SUS) entre janeiro de 2012 a maio de 2023. Os dados apontam que foram mais de 282 mil cirurgias nesse período. Só em 2022, no País, os registros alcançaram a marca de 31.190 procedimentos realizados, o que significa que – a cada dia – pelo menos 85 brasileiros tiveram seus pés ou pernas amputadas na rede pública de saúde. E, no Rio Grande do Norte, o número reduziu ao longo desses anos.
Os dados mostram uma alta progressiva no número de amputações e desarticulações de membros inferiores no Brasil. O levantamento revela que os dados acumulados em 2023 projetam este ano como o pior da série histórica iniciada em 2012. Elaborado a partir de informações disponíveis na base de dados do Ministério da Saúde, o estudo também acende o alerta para os cuidados voltados às doenças vasculares, como a síndrome do pé diabético.
“Os dados revelam a importância de campanhas de conscientização como o Agosto Azul Vermelho, que visa conscientizar a população sobre as doenças vasculares, seus riscos, prevenção e tratamento. Essas doenças estão se tornando cada vez mais prevalentes, e é essencial que a população esteja informada sobre prevenção e tratamento”, destaca Julio Peclat, presidente da SBACV.
Ele acrescenta ainda que o aumento no número de amputações é indicativo de que é preciso fortalecer as ações de saúde pública, promovendo hábitos saudáveis e acesso a tratamentos adequados. De acordo com os especialistas da SBACV, mais da metade dos casos de amputações envolvem pessoas com diabetes. No entanto, essas cirurgias em membros inferiores podem também estar relacionadas a muitos outros fatores de risco, como tabagismo, hipertensão arterial, dislipidemia, idade avançada, insuficiência renal crônica, estados de hipercoagubilidade e histórico familiar.
E, no Rio Grande do Norte, se comparado aos anos anteriores, teve uma redução considerável, saltando de 519 amputações, em 2022, para 174 até maio de 2023. O menor número já registrado desde 2012, que teve um total de 297 amputações. Sendo também o estado do nordeste com menor índice.
Dr. Márcio Villar, presidente da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular – Regional Rio Grande do Norte (SBACV-RN), comenta que esses números se deve, também, as medidas de prevenção que a SBACV-RN procura desenvolver, promovendo ações e campanhas de conscientização e atendimento ao público, como a que houve no último dia 16 de setembro, com o Check-up Vascular. “Recentemente realizamos uma ação de atendimento gratuito à população, no Ginásio Nélio Dias – Zona Norte de Natal. Foram mais de 600 atendimentos, além de distribuição de material e palestras de conscientização, abordando a importância da prevenção, do diagnóstico precoce, da adoção de hábitos saudáveis e do tratamento adequado. Tudo isso soma e faz a diferença. Temos muito a fazer pela frente”, explica o médico.
Gravidade – Outro dado preocupante apontado pela SBACV é o desconhecimento dos indivíduos sobre seu estado de saúde. Os especialistas afirmam que milhares de brasileiros têm diabetes e não sabem. “No mundo, uma em cada cinco pessoas ignora ser portador dessa doença. Muitos pacientes que chegam ao consultório ou aos serviços de urgência com complicações do diabetes só descobrem que a têm após o atendimento”, comenta o cirurgião vascular Mateus Borges, diretor de Publicações da SBACV.
Na sua avaliação, esse cenário exige cuidados por parte dos serviços de saúde no acolhimento dessas pessoas. Pacientes com diabetes e úlceras nos pés apresentam taxa de mortalidade duas vezes maior em comparação com pacientes diabéticos sem úlceras nos pés. Os submetidos à amputação maior de um membro inferior apresentam baixas taxas de sobrevida.
Aproximadamente 10% dos pacientes que amputam o membro inferior morrem no período perioperatório; 30% no primeiro ano após amputação; 50% no terceiro ano; e 70%, no quinto. Esse percentual pode ser maior em países em desenvolvimento, já que a procura por assistência médica costuma ocorrer quando a infecção da úlcera está avançada.
Cenário nacional – Na série histórica sobre a qual a SBACV se debruçou, é possível observar, em todas as regiões do País, a predominância de uma progressão no número de cirurgias de amputação. No comparativo entre 2012, ano que marca o início da série, e 2022, último ano em que foi possível obter os dados consolidados, houve alta de 65% no número de procedimentos.
O ano de 2022 bateu recorde e registrou a maior soma de procedimentos, 31.190 casos, resultando em uma média diária que ultrapassa 85 amputações. No entanto, a probabilidade desses números serem superados em 2023 já é desenhada a partir dos dados dos cinco primeiros meses do ano. O levantamento aponta que pelo menos 12.753 cirurgias foram realizadas entre janeiro e maio deste ano, número superior aos 12.350 registros para o mesmo período de 2022. Confira na tabela abaixo o detalhamento desses números:
*Até maio de 2023.
De acordo com os dados levantados, o acúmulo de procedimentos realizados até maio de 2023, em números absolutos, tem maior expressão nas regiões Sudeste e Nordeste. A primeira é responsável por mais de 42% de todas as cirurgias realizadas no Brasil, com um montante de 118.962 procedimentos. Já no Nordeste, 92.265 amputações ou desmobilizações de membros inferiores foram realizados no período. Na sequência, vem a região Sul, com 39.952 registros; o Norte, com 15.848; e o Centro-Oeste, com 15.546 registros.
Estados – Embora o crescimento no número de amputações realizadas entre 2012 e 2022 seja equilibrado em todas as regiões do País, a variação percentual nesse período chama atenção em alguns estados. Por exemplo, Alagoas foi a unidade federativa que mais sofreu alta no número de amputações, com crescimento de 214% na comparação entre o início e o fim da série histórica, um salto de 182 para 571 procedimentos.
Outros estados que registraram alterações expressivas no mesmo intervalo foram: Ceará, com variação de 175%; Amazonas, com alta de 120%; e Bahia e Rondônia, com crescimento de 83% na comparação entre 2012 e 2022. Em contrapartida, Roraima e Pernambuco foram os estados do País onde se observa a menor alta no mesmo método de análise, com crescimento de 12% e 18%, respectivamente. Confira mais detalhes sobre cada estado no quadro abaixo.
*Até maio de 2023
Em números absolutos, os estados que mais executaram procedimentos de amputações de membros inferiores no SUS em 2022 foram: São Paulo (59.114), Minas Gerais (29.851), Rio de Janeiro (24.465), Bahia (24.395), Pernambuco (18.523) e Rio Grande do Sul (16.269). Por outro lado, os estados com o menor número de registros são Amapá (376), Roraima (398), Acre (688), Tocantins (1.356) e Rondônia (1.606).
Despesas – Além de representar um grave problema de saúde pública, o crescimento constante no número de amputações no País traz fortes impactos aos cofres públicos, consumindo parte das verbas em saúde destinadas aos estados. Apenas em 2022, foram despendidos R$ 78,7 milhões em procedimentos realizados em todo o País. Entre janeiro de 2012 e dezembro de 2022 foram gastos R$ 799 milhões, o que representa uma média nacional de R$ 2.962,28 por procedimento.
“Esse volume de gastos poderia ser evitado se os sistemas de saúde investissem mais em medidas preventivas, sobretudo no acompanhamento de pacientes diabéticos. Esse público carece de atenção permanente e multidisciplinar, para que medidas drásticas, como a amputação de membros, não sejam tomadas”, explica o presidente da SBACV, Julio Peclat.
Prevenção – No caso do diabetes, cujos pacientes são as maiores vítimas das amputações, descuido que para algumas pessoas são pequenos podem levar a grandes problemas. Um pequeno ferimento pode resultar em infecção que evolui para um caso grave de gangrena, levantando ao risco de amputação, alerta Peclat.
O diabetes impacta a circulação sanguínea e gera o estreitamento das artérias, causando redução dos índices de a oxigenação e nutrição dos tecidos. Além disso, deformações nos pés e alterações de sensibilidade aumentam a chance do surgimento de pequenos ferimentos e potencializam sua evolução para casos mais graves. “Estudos apontam que 85% das amputações que possuem relação com o diabetes têm início com uma lesão nos pés, que poderiam ser prevenidas ou tratadas corretamente evitando complicações”, destaca o presidente da SBACV.
“Pessoas com diabetes, ao passar dos anos, desenvolvem neuropatia e/ou isquemia, o que as torna mais suscetíveis ao desenvolvimento de feridas de difícil cicatrização (úlceras) e infeções. A neuropatia acarreta a perda da sensibilidade ao toque, à temperatura e à dor. Com isso, o indivíduo não sente quando fere o pé. De modo geral, por não perceber, evolui para quadros de infecção que resultam em desbridamentos ou amputações”, pontua Julio Peclat.
Diagnóstico – Além desse contexto, a SBACV considera que o atraso no diagnóstico da síndrome do pé diabético faz com que o paciente seja encaminhado ao especialista apenas quando o problema já está em estágio avançado. Portadores da diabetes devem estar atentos aos cuidados relacionados ao controle do nível glicêmico no sangue e aos sintomas que podem ser observados em autoexames realizados diariamente.
Grande parte dessas amputações poderiam ter sido evitadas a partir de práticas de auto-observação. O paciente bem-informado, que se examina com frequência, pode reconhecer a necessidade de uma intervenção precoce já nos primeiros sintomas. Identificar sinais de alerta precoces é imprescindível para reduzir a incidência de complicações.
Complicações – Algumas medidas podem diminuir os riscos de complicações nos pés de pessoas diabéticas. Alimentar-se de forma equilibrada, praticar atividade física manter um controle da glicemia, contribui para uma melhora do sistema vascular como um todo. O paciente com esse fator de risco também deve estar atento aos perigos de acidentes e adotar mudanças de comportamento, como evitar andar de pés descalços ou, ainda, aderir ao uso de calçados apropriados.
Confira algumas medidas simples que podem ajudar na prevenção do pé diabético:
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Não faça compressas frias, mornas, quentes ou geladas nem escalda pés. Por causa da falta de sensibilidade acarretada pela neuropatia, você pode não perceber lesões nos pés;
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Use meias sem costuras ou com as costuras para fora. Assim você evita o atrito da parte áspera do tecido com a pele;
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Não remova cutículas das unhas dos pés. Qualquer machucado, por menor que seja, pode ser uma porta de entrada para infecções;
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Não use sandálias com tiras entre os dedos;
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Corte as unhas retas e acerte os cantos com lixa de unha, mas com muito cuidado;
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Hidrate os pés, pele ressecada favorece o surgimento de rachaduras e ferimentos;
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Nunca ande descalço. Você pode não sentir que o chão está quente ou que cortou/feriu o pé;
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Olhe sempre as plantas dos pés e trate logo qualquer arranhão, rachadura ou ferimento. Se não conseguir fazer isso sozinho, peça ajuda a um familiar ou amigo;
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Não use sapatos apertados ou de bico fino;
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Trate calosidades com profissionais de saúde;
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Olhe sempre o interior dos calçados antes de usá-los;
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Enxugue bem entre os dedos após o banho, a piscina ou praia.