Dia dos Pais: O que podemos aprender (ou não) sobre paternidade com o personagem José Leôncio, da novela Pantanal?
A Psicóloga Juliane Verdi Haddad alerta para o tipo de relacionamento controverso que o protagonista da trama global tem com seus filhos
Como diz o ditado popular “a arte imita a vida”, ou vice-versa. É comum, muitas vezes, nos identificarmos com cenas que acontecem nas produções televisivas e que sempre refletem a realidade que está fora das telas. Tem sido cada vez mais natural que a teledramaturgia aborde temas importantes para a sociedade e nos chame para reflexões mais profundas.
Uma das mais recentes produções da Globo, sucesso entre o público, o remake de Pantanal é uma prova disso ao levantar questões essenciais, até mesmo nas relações familiares. Além de chamar a atenção dos telespectadores com o enredo, alguns dos personagens despertam “amor” e “ódio” em quem segue a história escrita por Benedito Ruy Barbosa e agora adaptada por Bruno Luperi.
E já que agosto é o mês dos Pais, não podemos deixar de lembrar José Leôncio, interpretado pelo ator Marcos Palmeira. Um dos protagonistas da trama, o pecuarista se vê, de repente, pai de três filhos, quando pensava ter apenas Joventino (Jesuíta Barbosa), a quem não acompanhou o crescimento desde sua separação conturbada de Madeleine (Bruna Linzmeyer/Karine Telles). No decorrer do folhetim, Zé confirma ser pai de Tadeu (José Loreto) e ainda descobre um filho perdido, José Lucas (Irandhir Santos), fruto da relação com uma prostituta, quando tinha apenas 15 anos.
Realizado e feliz por ter os três herdeiros por perto, Zé Leôncio tenta acertar, mas acaba tento uma relação conflituosa com os herdeiros. Será que o comportamento do personagem é um modelo a ser seguido? Ou, mesmo não tendo a intenção e sem perceber, o tipo de relacionamento com os três não é dos mais saudáveis?
Usando como exemplo a história da novela, a psicóloga Juliane Verdi Haddad, de São Paulo, alerta para os erros comuns que podem ser cometidos na paternidade e dá dicas para uma relação mais saudável entre pais e filhos.
Doe-se de acordo com cada necessidade
Quem acompanha a trama do horário nobre da Globo já reparou o incômodo de Tadeu, (herdeiro mais novo de José Leôncio), comparando o tipo de tratamento que o pai dá para ele e para os outros irmãos. O comportamento faz com que ele se sinta preterido e fica cada vez mais chateado e enciumado.
A psicóloga explica que fora da ficção isso é mais comum do que pensamos, mesmo que não seja a intenção dos pais fazer diferença entre os filhos. A dica é tentar doar-se, mas sempre respeitando a personalidade e a necessidade de cada um deles.
“O tratamento diferente pode existir por necessidades diversas de cada um dos filhos, e isso, muitas vezes, pode ser percebido pelos outros como preferência. Inclusive, é comum que aqueles que dão maiores preocupações, ocupem mais o pensamento dos pais, sendo absolutamente normal. Com cada filho a relação é única e depende da troca entre eles. Filhos mais carinhosos podem, por consequência, ter mais afeto do pai até pelo fato de darem uma abertura maior. Mas o que não podemos esquecer é que toda relação é via de mão dupla e as duas partes, tanto os pais quanto os filhos, devem se doar”, analisa Juliane.
Nunca faça comparações entre os filhos!
Volta e meia, ao longo dos capítulos, nos deparamos com José Leôncio fazendo comparações entre Jove, Tadeu e Zé Lucas, reforçando, inclusive, que Joventino é mais inteligente do que os demais, que não passam de peões. Ele ainda enxerga no herdeiro mais talento para os negócios do que os outros e o prepara para substituí-lo no comando das fazendas.
“Este tipo de atitude acontece sem que os pais percebam, mas é preciso lembrar: um é diferente do outro! Quando os pais usam a comparação, o filho que ouve tem a tendência de se sentir inferior ou não admirado. Se isso acontece com frequência, pode afetar a autoestima e o faz sentir que não é amado pelo pai. Além de refletir, também, na relação entre os irmãos, que podem virar rivais”, alerta a psicóloga.
Não incentive a disputa entre irmãos
Um dos comportamentos, talvez o mais controverso, de José Leôncio com os filhos é a proposta da disputa pela sela de prata. O patriarca da família sugeriu aos três herdeiros que disputem entre eles a sela que pertenceu ao avô Joventino (vivido por Irandhir Santos na primeira fase da novela). O personagem deu ainda a entender que o vencedor, além de ficar com o prêmio em questão, demonstrará ser um “verdadeiro Leôncio” e merecedor de dar continuidade ao seu legado, como se os outros não tivessem os mesmos direitos.
A psicóloga alerta que, infelizmente, alguns contextos familiares podem contribuir para que haja disputa entre irmãos e, por consequência, terríveis conflitos.
“Pais que fazem comparações entre os irmãos, sempre tecendo elogios a um deles; famílias com bases mais fracas, onde não foi incentivada a cumplicidade entre os filhos; brigas por sucessões ou dinheiro também são comuns e acontecem, na maioria das vezes, por falta de limites dos pais na infância e adolescência… Enfim, diversas situações familiares podem afetar a vida de maneira geral, deixando as pessoas com dificuldade, inclusive, de confiar nos outros”.
Respeite o jeito de cada um
E apesar de atualmente o Joventino, aparentemente, ser o filho preferido de José Leôncio, nem sempre foi assim. O rapaz foi criado longe do pai e só voltou a procurá-lo já adulto e o reencontro não foi bem o que eles esperavam. Jove precisou que lidar com as frustrações do pai em relação a sua personalidade e chegou a sentir que era uma decepção para o fazendeiro.
“Respeitar o jeito de cada filho e lidar com as individualidades é essencial. Cada um tem necessidades e ideias diferentes. Lógico que a família tem valores e cultura que precisam ser respeitados, mas esperar que todos reajam da mesma forma é o maior erro. Promover conversas entre os filhos, ouvindo o ponto de vista de cada um sem desmerecer o outro, é uma ótima estratégia para um bom entendimento. Sempre passando a mensagem de que eles são parceiros, não rivais”, aconselha a psicóloga.
Juliane ainda reforça que, mesmo que a rejeição do pai em relação a algum dos filhos não seja real, somente uma impressão, é necessário sempre levar em conta: o filho se sente assim e por isso existe um sofrimento de fato para ele! Caso isso não seja tratado da forma correta, pode causar problemas sérios em longo prazo.
“Quando adulta, a pessoa que se sentiu rejeitada, pode ter dificuldades em ser amada pelos seus pares, ter complexo de inferioridade, não acreditar em sua capacidade de realizar as coisas, entre vários outros problemas. Terapia é o melhor tratamento. A terapia cognitiva, inclusive, pode ser muito eficaz nesta situação, pois ela capacita a pessoa a perceber seus erros de cognição, crenças irracionais e fornece ferramentas para corrigir esses erros e viver na realidade”, pontua a profissional.