Quando era criança, adorava ver aqueles filmes de viagem no tempo. Era bom demais flertar com a possibilidade de viajar para o futuro e, depois, para o passado. No início, minha vontade era apenas ver como seria o futuro, matar a minha curiosidade. Depois, como sou ansioso, queria ver se conseguiria alcançar as minhas metas da época. Será que passaria na faculdade? E pela faculdade, passaria sem repetir nenhuma matéria? E depois, conseguiria um estágio? Seria um bom profissional? Conseguiria uma namorada? Uma esposa? Uma filha?
Em seguida, a vontade era voltar ao passado. Agora que estava no futuro e sabia o resultado das coisas que imaginava quando adolescente, queria voltar para aproveitar mais. Sabendo o meu futuro, eu conseguiria viver mais tranquilamente, sem noites insones a pensar se daria conta. Entretanto, caro leitor, dedicada leitora, isso não é possível. Infelizmente, não podemos passear pelo tempo do modo que sonhávamos na infância, mas aprendi um truque que talvez lhe ajude.
E se eu disser que tem um jeito de espiar o futuro e reviver o passado? E você não precisará desenvolver um carro de inox alimentado por lixo de cozinha ou, então, uma carruagem voadora puxada por unicórnios. É muito mais fácil e só depende do seu círculo de amigos, mentores e aprendizes.
Como voltar ao passado?
Para voltar ao passado, basta ter acesso aos jovens. Na empresa, quando me reúno com os colaboradores mais novos, vejo isso acontecer claramente. É possível identificar conflitos e angústias dignas da idade em que estão vivendo. Digo isso, pois lembro-me exatamente quando as vivi. É interessante voltar no tempo da insegurança e ajudar nosso colaborador com as dicas do que fazer para vencer aquele desafio. É prazeroso encontrar o mesmo problema – que já consegui resolver lá atrás – pronto para ser resolvido.
Também é intrigante ver novas chances de arrumar falhas que cometi no passado, não deixando nosso colaborador cometê-las novamente. Quer saber como alcançar a meta da área comercial? Calma, vamos analisar cientificamente os indicadores antes de sairmos tomando atitudes na pura ansiedade. Por que? Porque já fiz isso algumas dezenas de vezes e o resultado foi sempre pior do que agir com calma.
E o mesmo acontece com a emoção e a energia dos mais jovens. Quando enxergo um projeto mais desafiador e fico preocupado se vamos conseguir dar o ritmo necessário, volto aos meus 25 anos quando vejo a empolgação da turma com ele. É bom demais poder contar com a energia da juventude na empresa.
E para o futuro, como viajar?
É o mesmo conceito, porém com os mais velhos. Hoje, próximo aos 40, ainda tenho muitas dúvidas e questionamentos sobre a empresa e até sobre a vida.
Quando converso com meus mentores, mais velhos e experimentados, acalmo e ajusto o rumo da minha trajetória. Meus pais, por exemplo, sempre foram fundamentais para a minha tranquilidade. Foram eles que sempre colocaram a experiência do caminho para filtrarem meus medos e ansiedades. Ajuda demais saber que, se as coisas derem errado, encontrarei um porto seguro para garantir as minhas necessidades básicas.
Há momentos em que ter uma ideia do que acontecerá com minha carreira, se seguir em determinada direção, ajuda demais. Se não fossem eles, não teria tido estofo para remar contra a maré e optar por um caminho pouco convencional. Talvez não seja o seu caso, mas podem existir outras pessoas na sua vida para te acolher e te ajudar a elucidar os caminhos. Saber identificá-las é muito importante, especialmente para momentos de dúvidas e tomadas de decisão.
Comecei como estagiário em uma pequena empresa, nas férias. Trabalhando sem remuneração, tive acesso ao proprietário e vi como eu seria no futuro se tudo desse certo. Identifiquei lacunas na formação dele que também teria na minha, se trilhasse caminho semelhante. Por isso, resolvi experimentar o estágio em um grande banco.
No banco, não identifiquei, nos meus superiores, um estilo de vida que fizesse sentido para meus valores e velocidade. “Pivotei” e fui trabalhar na pequena indústria da família. Lá fiquei por dois anos e vi que não havia dinheiro disponível para tirar do papel as coisas que gostaria.
Vi que, para ter acesso aos recursos para tirar os sonhos do papel, precisaria estar melhor formado e preparado. Fui lecionar no período noturno e cursar a pós-graduação durante o dia. Feito o mestrado, mergulhei no doutorado, mas sem a pretensão de me tornar professor de carreira. Queria o acesso ao conhecimento e o aprendizado como consultor. Ter meu co-orientador como referência e sócio me ajudou demais nesse período.
Quando a carreira estagnou com a empresa, encontrei uma referência mais forte no mundo corporativo e para lá voltei. Foram 2 anos para formar a rede de relacionamentos e testar o que havia aprendido em larga escala.
10 anos depois do início da jornada, voltei ao plano de empreender. Porém, com os contatos e conhecimentos para colocar, em prática, o sonho que tinha de empresa.
O ir e vir
E, assim, o ir e vir na dimensão do tempo me ajudou demais a encontrar a melhor forma de fazer as coisas. Por isso, não perca a oportunidade de viajar no tempo! Ouça os mais velhos, converse muito e transfira o conhecimento deles para você. Ao mesmo tempo, cerque-se dos mais novos para ser contagiado pela energia e corrigir os erros do passado. Além, é claro, de sentir o frescor das novas tecnologias e costumes. Dessa forma, independentemente da idade, você será um profissional atemporal, já que domina o segredo da viagem no tempo.
Virgilio Marques dos Santos é um dos fundadores da FM2S, doutor, mestre e graduado em Engenharia Mecânica pela Unicamp e Master Black Belt pela mesma Universidade. Foi professor dos cursos de Black Belt, Green Belt e especialização em Gestão e Estratégia de Empresas da Unicamp, assim como de outras universidades e cursos de pós-graduação. Atuou como gerente de processos e melhoria em empresa de bebidas e foi um dos idealizadores do Desafio Unicamp de Inovação Tecnológica.