Uma batida na porta,
Leve,
Quase suave.
O ranger da porta quebra o silêncio da concentração. A pequena, nos seus 104 cm, adentra o consultório.
Sem dizer qualquer palavra, puxa a cadeira e senta. Observa.
No silencio permanecem.
Uma a terminar seu relatório, a pequena a computar cada gesto, objeto, estrutura na sala.
Resolve quebrar o silencio: -“tia, vou para a policlínica, tomar a injeção da perninha, mas depois eu volto, pois tem carnaval”.
Questionada sobre a fantasia: – “vou de frevo, falta só a sombrinha”.
Entrega a cabeça careca, a espera do beijo de despedida.
Seu sorriso escondido pela mascara de proteção é revelado pelo olhar.
Com um gesto da mão direita e uma piscada, a pequena encerra com leveza a breve conversa. Quis comunicar sua agenda planejada à “tia”.
A porta se fecha.
Na sala vazia, sem a pequena, fica a sensação que todo dia pode ter fantasia.
Por Annick Beaugrand
Médica Oncologista Pediatra – Casa Durval Paiva
Professora Dep. Pediatria UFRN