NOTADAMENTE naqueles tempos foragidos das inspeções legais, havia além da inocência sertaneja a discriminação dos urbanistas citadinos de chamar todo caboco da roça de matuto burro e ignorante. Mas se esses medíocres tivessem pelo menos um bucadim de tempo disponível para observar as nossas riquezas de costumes e tradições não iriam zombar que nem lacaios pasmos das profundezas do inferno. Viriam por um tiquim de pesquisas que nosso povo é de uma inteligência tão fossilizada que nem por tantas gerações há de se ter um povo desses. E viriam que de coisas simples se faziam alegrias tão imensas que não se calculavam o prazer de vivê-las e produzi-las. (FOTOS DE EDNALDO LUÍZ).
Ocorre que mesmo em instância de famigerada necessidade o seridoense em si era um povo muito criatório, cujos animais domésticos se estendiam desde poicos, perus e guinés, até patos, bois, entre tantos. A pecuária era chamada de criação. E as aves se multiplicavam em diversidades, entre tais as galinhas que além de darem seus ovos fortes e de fibras, forneciam á culinária seridoense as gostosuras de suas carnes caipiras.
Dessa forma, por haver tantos criadouros de galinhas nos rincões sertanejos, como também galinhas de todas as cores, a criançada vivendo esse momento deveras tenha despertado o gosto caipira por zelar de galinhas a tal ponto que se reproduzia isso nas brincadeiras de outrora. Bruguelos e bruguelas queriam serem donos ou donas de galinheiros de mentirinha. Para tanto despertaram eles a diversão de olhar pausadamente, como de costume se fazia, à natureza e dela tirar o sustentáculo da infância orgânica, pura e sadia.
Assim, observavam os frutos não comestíveis da planta catingueirenta conhecida como PEREIRO. O pereiro dava em tempos bons de molhado um fruto (ver foto de Ednaldo Luíz) que mais parecia uma borboleta com as asas abertas, mas que a molequeira enxergava como se fosse uma galinha de asas abertas. E como tal passaram a ganhar os matos de Caatinga a procura desses frutos. E quando alguém lhes perguntava “aonde vais, menino sambudo?”, ouvia-se logo a resposta curta e grosseira “vou pegar galinhas de pereiro!”. Também os moleques percebiam que ás vezes as galinhas gostavam de fazer poleiro em pés de pereiro, daí juntaram o útil ao agradável e denominaram o fruto do pereiro de GALINHAS DE PEREIRO.
E aí pousavam a brincar em demasia. Faziam eles um chiqueiro de palitos de picolés, de gravetos ou de outra planta qualquer e colocavam as galinhas de pereiro dentro do cercado. Uns bruguelos mais agalinhados ainda tinham a tenência de imaginar uma galinha chóca e colocavam pedrinhas pequenininhas debaixo das aves para dizer que elas tinham punhado. Era a imaginação frutífera das crianças de outrora.
Uns ainda mais agalinhados cacarejavam como galinhas histéricas para embichar mais o negócio. E ficavam horas a fio e num tinha tempo ruim não. Claro que o tempo dos tempos idos não passava nem querendo correndo como os tempos de hoje. Mas era divertido brincar de galinhas de pereiro. E ainda havia por excelência o sacrifício de uma galinha de pereiro para matar a fome fictícia de seus donos encafifados. Era então uma galinhagem medonha nos moldes da imaginação. Cocoricó!!!
AUTOR E FOTOS: EDNALDO LUÍZ DOS SANTOS.
Natally
Tenho tantas lembranças de estar no meio do mato procurando as galinhas